terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Dramas da vida de quem sofre e de quem tem sorte em na verdade nada sofrer


Hoje não me apetece ir à salsa.
Sinto-me murcha, sem energia. Por isso, decidi não ir e escrever este post como desabafo.
Tudo à minha volta anda num reboliço.
As pessoas estão todas doidas e o tempo não ajuda.
Ontem a mãe de uma pessoa que conheço bem suicidou-se, morreram lisboetas por causa da tempestade de domingo, chovem divórcios de pessoas que ainda se amam, pedidos de incumprimento e de alteração de pensões de alimentos miseráveis que mesmo assim, os pais teimam em não pagar, penhoras de vencimentos em execuções por dívidas e por alimentos, telefonemas e pedidos de ajuda, de desabafo e de atenção, de quem não tem ninguém que as ouça ou que lhes dê os bons dias.
Também não ajuda ter de preparar um julgamento para quinta sobre um crime de maus tratos domésticos, um drama diário prolongado durante 20 anos... é irónico ter sido eu, uma miúda, a aconselhar uma graúda a perder o medo e sair de casa.
Isso foi já foi há uns anos quando recebi o caso... Agora ela está bem, já vive com um namorado... mas não ultimamente, não tem dormido bem porque se aproxima o dia do julgamento. Ontem quase chorou de novo ao telefone... temos de ir a tribunal e ela naturalmente tem medo de o encontrar sozinha no corredor... além disso, não quer reviver tudo de novo... ainda por cima, à frente dele e de todos nós.
Às vezes, não percebo mesmo as leis que temos. Qual é a lógica? Ela é a vítima! Como a obrigam a depor como testemunha de acusação? A prova também consta dos relatórios das urgências!
E quase ninguém se preocupou ou conseguiu ajudá-la nesses momentos.
Teve sempre de suportar sozinha, indefesa às agressões, às injúrias, às difamações do marido aos vizinhos... diz quase tudo se eu disser que o julgamento foi marcado para seis anos depois da primeira queixa...
O Estado nem lhe deu casa quando teve coragem para fugir e enfrentar o medo de ser apanhada pelo "arguido-cônjuge"... a polícia nunca nada pôde fazer senão acumular na esquadra queixas-crime da mesma pessoa contra a mesma pessoa e por causa do mesmo assunto... pois nunca foi flagrante delito... tudo se passava em casa e de cortinas bem fechadas.
Fui dando o que pude e o que sabia, o que não foi nada para o que ela viveu no dia-a-dia de um casamento... de medo.
Foi das primeiras oficiosas que recebi... lembro-me que na altura me sentia assustada e desajustada à sua realidade e ao meu papel.
Era uma miúda sem experiência de vida para lidar ou ajudar uma pessoa naquela situação ou com aquele tipo de problema. Sempre que com ela falava, agradecia a minha sorte em ter tanta sorte... pouco ou nada sabia dizer, fazer ou dar de conforto, mas mesmo assim ela ainda hoje me agradece.
Perante isto, o que dizer dos meus dramas diários?... patéticos, claro!
Por exemplo, a maldita Emel... que inferno!...
Odeio a EMEL, odeio aqueles verdes homens ambulantes de máquina na mão, sempre prontos a disparar... nunca pensei sentir ou verbalizar isto assim... mas é a pura verdade, não nutro por eles mesmo nada de bom.... acreditem. Se eu fosse Presidente da Câmara de Lisboa, extinguiria a EMEL, mesmo sabendo o jeito que dá na amortização do empréstimo da Câmara!
Por cautela e em busca da minha tranquilidade diária, ando agora a pé e de metro... para não ser bloqueada... para fugir à renda diária de dezenas de moedinhas amarelas que quase nunca tenho na carteira. Quem tem?
Eu sei, eu sei... posso aderir ao método da raspadinha... mas não me rendo! Prefiro andar a pé e usar os transportes públicos! Não é essa a teleologia da existência da EMEL? Que assim seja!
Andei toda a semana passada, em sprints anti-Emel e a espreitar freneticamente pela janela por causa do carro.
A parte gira... é a cumplicidade e a solidariedade que se cria entre "colegas de carros estacionados sem pagar"... cheguei mesmo ao ponto de um dos meus colegas de escritório me mandar pelo ar a chaves do carro dele e 0,50€! Safei-o... o homem verde já se aproximava com um sorriso vampiresco.
Ao que se chega.... pagar para ter o carro estacionado na via pública... que loucura, que abuso!
Hoje é banal pagar para estacionar, para evitar a fita amarela enrolada no nosso carro e a taxa do reboque e do parque da Polícia Municipal.
Já ninguém discute isto... "paga, cala-te e safa-te" é o lema instituído. Que infelicidade.
Ainda hoje pasmo com a resposta da mulher-polícia que recebi quando na semana passada a interpelei, entretida e satisfeita a multar e bloquear os carros aqui em baixo na rua. Disse assim, foi hilariante...: - "Vai ver que agora toda esta rua vai ficar limpinha!". Fiquei bloqueada e sem resposta.
Quid juris?

1 comentário:

Patriarca disse...

As mortes em causa são uma tragédia.

O drama das vítimas de maus tratos vai muito para além do medo. Ou de uma casa.

Por acaso, também gosto da Emel e da Polícia Municipal. Bem Hajam.

Cumprimentos,